Ninguém sabe o quanto eu caminhei

Este mês a minha vida foi um turbilhão que encontrou um furacão, dá para imaginar?
Estou trabalhando alucinadamente, ainda bem, eu até que gosto desse ritmo. Valeu a pena!
Eu reclamo que tenho pouco tempo, estou sempre correndo, tenho que fazer um esforço tremendo, enorme para conseguir encontrar as pessoas e nisso acabo deixando algumas coisas minhas para trás, mas não me arrependo porque é sempre bom encontrar essas pessoas.
O violão que eu tenho que buscar desde o ano passado, a aula de inglês eu comecei, mas estudar que é bom, naaaadaaa.
As lâmpadas do lustre estão queimadas a meses, ainda resta uma última, então eu acho que vou deixar até esta se acabar para comprar e deixar todas novinhas...ihh ainda tem a maçaneta do armário que quebrou, o varal que estourou um lado.
Ah tem o vidro da janela do banheiro que precisa ser trocado, os papéis do ano passado para organizar e guardar, as fotos que eu comecei a organizar e parei na metade, o livro de receitas que eu só fiz 3 paginas, aiiiii meu Deus, eu quero um clone!
Pelo menos as coisas para doar eu separei e já doei.
E os livros? Preciso organizar, separar o que quero ler, reler e terminar os 3 que estão me acompanhando desde o ano passado, é, eu ainda leio 3 livros ao mesmo tempo, coisa de gente maluca.
Fora as gavetas, as de casa, do escritório, enfim gavetas e mais gavetas para organizar, limpar, jogar o lixo fora.
Depois da minha viagem do Carnaval ainda tenho que fazer as coisas básicas em um salão de cabeleireiro, afinal eu fui para o meio do mato, minhas unhas unhas, cabelos, etc precisam de cuidados.
Ah e ainda tem a academia, que ficou, ficou e agora precisa entrar na agenda, Jesus me ajude!
Socorro, dá para a Terra girar menos rápido, eu preciso de tempo!
Tudo bem, eu aguento, eu mereço e a-do-ro, eu estou feliz na minha correria insana, meio esquecida, dispersa, mas tenho percebido mais sorrisos em meu rosto, mais brilho nos meus olhos, mais graça neste caminhar.
Talvez eu morra jovem, afinal meu corpo está andando sem muitos cuidados de minha parte, mas se for assim que seja, nem disso eu reclamo, porque este caminho está alegre e mesmo com toda essa correria, as flores que enfeitam são as pessoas maravilhosas que eu vou encontrando, algumas eu recolho, outras eu só agradeço por encontrar e vou seguindo em frente.

Carlos Drummond de Andrade

Amor e seu tempo
Amor é privilégio de maduros
estendidos na mais estreita cama,
que se torna a mais larga e mais relvosa,
roçando, em cada poro, o céu do corpo.

É isto, amor: o ganho não previsto,
o prêmio subterrâneo e coruscante,
leitura de relâmpago cifrado,
que, decifrado, nada mais existe

valendo a pena e o preço do terrestre,
salvo o minuto de ouro no relógio
minúsculo, vibrando no crepúsculo.

Amor é o que se aprende no limite,
depois de se arquivar toda a ciência
herdada, ouvida. Amor começa tarde.



Memória
Amar o perdido
deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.

As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão.

Mas as coisas findas,
muito mais que lindas,
essas ficarão.



Amar
Que pode uma criatura senão,
entre criaturas, amar?
amar e esquecer,
amar e malamar,
amar, desamar, amar?
sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,
sozinho, em rotação universal, senão
rodar também, e amar?
amar o que o mar traz à praia,
e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,
o que é entrega ou adoração expectante,
e amar o inóspito, o áspero,
um vaso sem flor, um chão de ferro,
e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: amor sem conta,
distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
doação ilimitada a uma completa ingratidão,
e na concha vazia do amor a procura medrosa,
paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.

As vezes, só as vezes

As vezes o que se quer está a uma certa distancia e o que se tem é o possível, o prudente.
O desejo muitas vezes é traiçoeiro e manipulador, alucina, encanta, mobiliza para o devaneio ou paralisa.
A voz que vem de dentro, onda fria que apazigua, que serena este anseio, a razão, o óbvio, o concreto.
Conhecer a si também é isso, chamar para fora a outra e guardar aquela.
Só guardar e, as vezes.
Enquanto isso a garota levada, à espreita, sorri.

Quando eu me decepciono o meu lado negro desperta

Hoje o meu lado negro disse olá para alguém.
Ele é cruel, frio, implacável, extermina sem culpa, sem constrangimentos.
Existem pessoas que conseguem tirar de você o seu pior, aquilo que você não gosta em você, aquilo que é melhor ficar dormindo. Mas como isso aconteceu comigo? Justo eu! Simplesmente porque eu permiti, porque eu mesma dei este poder, porque fui ingenua, porque confiei, porque acreditei, porque me iludi com aquilo que gostaria que fosse e não com o que realmente é.
Me faz mal dizer palavras tão duras, ferir, me faz mal me sentir traída nas minhas convicções mais profundas, me faz mal me decepcionar com alguém e ter que retirá-la da minha vida como se nunca tivesse sido nada, principalmente quando o foi.
Essa sensação de quebra é algo tão amargo e inevitável na decepção.
Eu acreditei demais e é esta a minha parcela de culpa.
Acreditei que você tivesse aprendido, acreditei que quisesse ser diferente, acreditei em palavras mesmo vendo que a sua vida, a sua história, as suas atitudes o contradizem o tempo todo.
Eu achei que você tinha ao menos isso, alguma noção da importância da confiança, o sentido do encontro entre duas pessoas.
Eu me enganei, você não sabe e nem nunca soube, eu me enganei, me iludi, e recebo com isso a tristeza de saber que o peso da minha mão nestes momentos é cruel.
Fique longe de mim, eu não quero te ferir mais, porque sei que eu posso, sei como fazer e se o fizer, não sentirei qualquer remorso, meu lado negro não sente algum e foi você que o despertou.
Agora, é só o vazio, o abismo que existe entre nós, e esta indiferença pela sua vida. Não, eu não estarei mais lá, não estarei lá para sorrir quando você se alegrar e nem estender a mão quando você cair, não te direi as minhas impressões, não ouvirei seus lamentos, agora é somente o vazio.
E como num dia de luto, o corpo dói, a boca amarga, não há mais lágrimas, apenas o vazio, o nada, uma tristeza resignada, inexorável e o adeus.

A arte de "O Curioso Caso de Benjamin Button", de David Fincher




Eu confesso que fui ao cinema sem muitas informações sobre o filme, vi um trailler e achei interessante, depois uma amiga foi ver e disse que foi um dos melhores filmes que ela assitiu. Eu lancei a idéia para alguns amigos e combinamos a sessão.
Meu encantamento começou logo, na narrativa de Benjamin sobre sua própria vida, de uma forma sensível e até terna, ele conta seu nascimento, que poderia ser um drama, um horror, mas, de um jeito tão especial, doce, que eu não consegui pensar na feiúra que ele nasceu, somente no amor que a mãe de criação dele, Queenie (Taraji P. Henson) tinha no coração por qualquer ser humano.

Aliás, a mãe dele é um personagem que trás boa parte do filme como uma lição de vida, mulher forte, alegre, otimista, positiva e sábia, de uma sabedoria daquelas que vem da essência inegável do espírito.
O filme me tocou, não me trouxe nada de novo em reflexão, porque encontrei nele muitos pensamentos que já me são íntimos, porém me trouxe aquela sensação de bem estar que só uma bela obra de arte permite.
A idéia de aproveitar os momentos da vida porque são únicos e não voltam, a certeza de que a vida nos proporciona encontrar pessoas maravilhososas e que, apesar de querermos muito, o enlace de vidas não se torna possível, e ao mesmo tempo o desejo de que tudo pode acontecer, pois ninguém sabe o que nos espera.


Eu sai do cinema com aquela sensação de êxtase contemplativo, que me arrebata quando sou tocada por alguma forma de arte que fala com minha alma.
O filme realmente é bom, o roteiro, os atores, a fotografia, a trilha sonora, todos os detalhes que cuminam numa harmonia perfeita para a melhor melodia da linguagem da alma.
E arte para mim é exatamente isso, sentir este bem estar, este êxtase produzido pelo belo, pela sintonia de outros sentidos estimulados pela criatividade sensível de outro ser humano.
Este filme me deixou feliz!

Gente que culpa

Será que é tão difícil perceber que culpa não existe? Apenas as consequências existem. A culpa é criação própria, uma armadilha que o ego aciona para justificar a paralisação.
Ela culpa o marido porque está carente, ele culpa a esposa porque está entediado.
O filho culpa o pai porque não se sente capaz, o pai culpa o filho porque não se sente realizado como pai, a mãe culpa o pai porque estava ausente, o pai culpa a mãe porque protegeu demais. Culpa, culpa, culpa.
Definitivamente não gosto dessa palavra!
Somos frutos das consequências de nossas escolhas, nossos atos, nossas reações. Nossa vida é um reflexo fiel de nós mesmos, daquilo que nós cultivamos em nossa mente, no nosso íntimo, lá onde ninguém mais vê, e muitas vezes, nem nós mesmos, porque preferimos culpar os outros, a vida, o universo, a sorte, Deus! Procurando o culpando perdemos um tempo precioso que poderia ser empenhado em buscar nossas curas.
A vida na sua perfeição, vai sendo desenhada a cada escolha e sem se dar conta a pessoa mesma cria seu universo, que muitas vezes não é o universo que ela sonhou, mas foi o que ela mesma criou e foi construindo tijolo a tijolo.
Ninguém muda ninguém, ninguém cura ninguém, cada um é responsável por seu próprio universo.
Quanta ilusão se esconde por trás de uma decepção, uma mágoa, uma revolta!
É mais fácil olhar para o outro e culpa-lo do que olhar para dentro de si mesmo e ver o que está causando tanto estrago.
Orgulho e vaidade, pai e mãe de tanto sofrimento!
A paz somente será sentida depois da libertação, depois que o olhar se transformar.
Se você soubesse como é bom se sentir livre, leve e em paz, não ficaria remoendo tantas coisas que aconteceram lá atrás e perceberia que a grande verdade é que quem procura um culpado, não quer uma solução, quer uma desculpa para se manter no mesmo lugar. Culpa tudo e a todos menos a quem realmente construiu a história, o próprio, o autor de sua própria história.
Crescer, amadurecer depende deste olhar para dentro e, buscar a verdade com humildade e honestidade para se ver como realmente é.
Cada um é responsável por si, pela sua vida, pela sua colheita, pelas suas consequências.
Não responsabilize os outros pela sua capacidade de se iludir perante a vida, essa capacidade foi você mesmo quem criou! Liberte-se!
Ser maduro é isso, não é acertar sempre, mas aprender com os erros e assumir as consequências das suas próprias escolhas.
A vida é como um bumerangue, no fim tudo que volta para você foi produzido por você mesmo, de alguma forma, mesmo que você não tenha se dado conta.

Trecho de Vagalumes do TM, veio a calhar

"...E foi até estranho, a gente nem deu conta
talvez na outra ponta, alguém pudesse pensar
menino vagalume, flor, menino estrela, a brisa mais forte veio te buscar

Pra temperar os sonhos e curar as febres
inserir nas preces do nosso sorriso
brincando entre os campos das nossas idéias
somos vagalumes a voar perdidos...a voar perdidos...

E quando a gente apaga, tudo fica escuro
Mas o medo não vence, pois lutamos só
Por de cima do muro, a gente enxerga o mundo, a fábrica de Deus fazendo gente do pó
Deixa pra lá o que não interessa,a gente não tem pressa de viver assim
Feito platéia da nossa própria peça, histórias, prosas, rimas, sem começo e fim"

Um furacão

Eu estava tão segura atrás daquele muro que eu mesma ergui em volta do meu mundo, tão segura, foi só dar uma espiadinha lá fora que tudo ficou diferente.
Aquele muro erguido, com tantas explicações, razões, lágrimas, conceitos, decepções, desejos, surpresas, expectativas, paixões. Atrás do muro um lindo jardim sem expectador algum, mas que nunca deixou de florir por isso, um mundo seguro, com uma felicidade racional, tranquila.
Eu não tive tempo de escalar, fui puxada para o outro lado do muro, como se um furacão me traga-se.
Foi isso mesmo, um furacão, viajei dentro dele, vi coisas que eu havia esquecido, senti a volúpia desenfreada, eu me vi sedenta, ardente e sem a menor razão, no fim da viagem apenas o êxtase do fim de uma aventura deliciosa e eu acordei do lado de fora da minha segurança racional.
Nova adaptação, novos horizontes, novas possibilidades, e uma criança sapeca precisando de limites.