Minha mãe é uma pessoa singular, diferente das outras mães, e eu, por isso, exercitei desde muito cedo, a não julgá-la.
A minha terapeuta me disse um dia, que a figura de pai e mãe é um mito. Pesquisando sobre "mito" encontrei uma obra muito interessante do Levi-Strauss "Mito e Significado"
Cada um de nós é uma espécie de encruzilhada onde acontecem coisas. As encruzilhadas são puramente passivas; há algo que acontece neste lugar. Outras coisas igualmente válidas acontecem em outros pontos. Não há opção: é uma questão de probabilidades.Eu entendo que o papel de Mãe é muito especial, mas o fato é que uma mulher que passa a ser mãe é antes de qualquer coisa um ser humano, uma pessoa, uma mulher e depois Mãe.
Algumas mulheres tem a capacidade de se tornarem exclusivamente Mães e deixam de lado todas as outras coisas. Eu confesso que admiro estas mulheres.
Eu não sou mãe, não posso dizer como serei, e se serei uma. Posso dizer que sou uma observadora e filha e é com este olhar que posso refletir.
A minha Mãe e eu tivemos muitos tipos de relações no decorrer de nossas vidas até aqui e é possível que tenhamos outros, mas não me resta a menor dúvida de que ela me ama com todas as forças de que é capaz.
Eu passei a infância achando que ela não gostava de mim, havia uma diferença no tratamento que ela tinha comigo em relação aos meus irmãos, coisa confirmada mais tarde pela minha avó, mãe dela.
Eu nunca precisei fazer terapia por causa disso, meus problemas foram outros. Quando eu tive a oportunidade de sair de casa para estudar, na época com 16 anos e morando no interior, ela me deu a maior força. A princípio eu achei que ela queria se livrar de mim, coisa de uma cabeça adolescente. Depois, quando eu já estava a meses sem visitar meus pais, tive a real idéia sobre o que foi aquilo.
A minha mãe teve muitos sonhos não realizados. Ela sonhou em ser independente, em viajar o mundo, mas casou muito cedo. Ela sonhou com um casamento de princesa que não foi possível. E quando esposa, sonhou em ter uma vida cheia de regalias que não teve. Uma pessoa que teve uma infância difícil, com referencias de afeto bem complicadas.
Eu acho que ela se saiu o melhor que pôde, mas o mito de que ser mãe é ser toda a dedicação do mundo, isso ela não foi.
Ela não queria que eu passasse por tudo que ela passou e não tivesse acesso a tudo que ela sonhou. Ela queria para mim o melhor de tudo e para ela o melhor era tudo que ela não teve. Tem coisa mais Mãe do que isso?
Foi com ela que aprendi que as pessoas tem formas muito diferentes de amar e que referencias de afeto podem determinar sua forma de se relacionar por toda a vida, se você não se conhecer, não se perceber e não ir atrás de outras formas de conhecimento, de referencias.
Eu fui embora da casa dos meus pais cheia de mágoas, e mágoa precisa de perdão para sarar.
Hoje eu ouvi uma coisa sobre isso. "Perdão pressupões mágoa, se você não magoou ou não se magoou não há necessidade de perdão". Mas eu precisava muito deste perdão, o perdão dela, por julga-la por tanto tempo como uma mãe que não me amava e o meu perdão por mim mesma e por ela.
Ela é minha Mãe, me gerou, me alimentou, cuidou de mim quando estive doente, acordou muitas noites com meu sonambulismo infantil, enfim fez tudo que era preciso para ser uma mãe zelosa com seus filhos.
Embora fosse mãe, nunca esqueceu que era mulher e uma mulher bem ciumenta do meu pai.
Foi ai que nós nos esbarramos. Eu e meu pai sempre fomos muito ligados, desde muito criança. Eu fui a Xodó do papai e isso incomodava a minha mãe de uma tal forma que ela não conseguia disfarçar, nunca conseguiu, na verdade. Isso só passou depois que eu sai de casa.
A minha avó me contou recentemente que quando eu tinha uns 7 anos eu perguntei pra ela "Vovó porque a minha mãe não gosta de mim?" E a minha avó respondeu o que ela diz até hoje: A sua mãe é assim mesmo, sempre foi esquisita, mas é claro que ela gosta de você.
Conseguir da minha mãe uma demonstração de afeto não é coisa muito fácil, mas eu já vi muitas vezes. Na verdade vejo isso toda vez que vou visitá-la. Hoje eu vejo nos seus olhos o quanto ela me ama, o quanto deseja para mim o melhor que a vida puder me dar. Vi o quanto ela se preocupa todas as vezes que apareci com alguém depois que me separei, mas também vi quando disse que iria me casar.
A minha mãe ama na calada da madrugada, depois que todos foram dormir, nas orações para cada filho, nas suas intuições (que são infalíveis) e nos toques que ela nos dá sobre alguém em quem confiamos que mais cedo ou mais tarde nos decepciona.
Ela não é do tipo que ficava acordada me esperando chegar, quem fazia isso era o meu pai, minha mãe sempre confiou na sua intuição. Então, se sentia que estava tudo bem, ela dormia.
Ela diz que quando alguma coisa de ruim está para acontecer com qualquer um de nós, ela sente e se prepara e prepara tudo. Ela é forte, é calma, mas por trás da primeira impressão, está lá bem no fundo, uma mulher que sonha e que é muito sensível, tão sensível que se mostra durona para quem ninguém saiba.
Eu me vejo como ela muitas vezes, acho até que, fisicamente estou ficando parecida com ela. É muito estranho, porque sempre fui a filha mais parecida com a família do meu pai. Genética, vai entender.
Por motivos maiores não estarei com a minha mãe neste dias das Mães, mas gostaria de deixar aqui, onde deixo tudo gravado, o meu imenso amor por ela. Desejo que ela seja muito feliz, desejo que realize todos os seus sonhos e desejo muito que um dia eu possa colaborar com algumas destas realizações. Desejo que a vida seja generosa com ela.
Feliz dia das Mães para todas as mamães, que elas tenham a luz da sabedoria para ajudá-las sempre que for preciso.
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