Missão cumprida papai!

Me parece das missões das mais difíceis ser pai de menina.
Digo isso por mim, para que não haja controvérsias, já  que não é a polêmica o objetivo desta postagem.
Para uma menina seu pai é o seu primeiro grande amor, é a sua primeira e mais forte referência masculina, é sua fonte de inspiração na relação homem-mulher, é seu ponto de partida nas relações afetivas.
Meu pai sempre teve defeitos como qualquer ser humano, mas soube, com toda a sua simplicidade, me mostrar o que é o amor, como se deve demonstrar, oferecer e receber carinho. 
Graças a ele eu soube que o carinho a gente oferece e ponto, a outra pessoa aceita se quiser, sem obrigação, sem cobrança, sem esperar nada como retorno.
Meu pai sempre foi muito carinhoso comigo, mesmo quando não estávamos mais perto fisicamente, ele me telefonava para dizer que me amava e que sentia saudade e para me perguntar se eu estava feliz. Sempre me dizia para buscar um trabalho pelo qual eu fosse apaixonada porque trabalhar sem amar o que se faz era muito cansativo. Foi o que eu fiz. Hoje amo apaixonadamente o que eu faço e não me canso.
Meu pai me ensinou a ser independente, desapegada, a ser do mundo e a ter sede de conhecimento.
Meu pai me ensinou que o respeito é coisa que não se exige, ele é emanado por você, as pessoas ao seu redor apenas o sentem porque ele já está em você.
Ele sempre respeitou minhas escolhas, apesar de as vezes não concordar com algumas delas, nunca invadiu minha vida com opiniões e julgamentos que eu não tenha pedido. 
Isso tudo não quer dizer que ele nunca tenha errado comigo em nossa vida compartilhada, isso não vem ao caso hoje, porque hoje é o dia de falar dos acertos e não dos enganos. 
Eu tenho certeza que ele não concordou comigo muitas vezes e que me julgou (talvez) mas isso ele fez em silêncio, pois não me castigou com seus pensamentos e julgamentos contrários, o que eu agradeço imensamente. Não há nada pior para uma filha que está passando por momentos difíceis do que no meio do seu inferno ter que argumentar com seu pai ao invés de poder correr para seu colo.
Todos erramos, todos nos enganamos, nenhum de nós é o senhor da razão. E a vida, cada um tem a sua para cometer seus próprios erros, a consequência disso é de cada um e ninguém tasca.
Meu pai me ajudou a ser quem eu sou, me ajudou a ter coragem para me arriscar, me ajudou a identificar quem me ama, me ajudou a ter senso crítico e a defender meu ponto de vista com dignidade.
Mas sem dúvida a coisa mais importante que meu pai me ensinou foi sobre ser amada.
Na minha vida amorosa eu posso ter me enganado em relação ao caráter dos meus companheiros, mas de forma alguma eu errei quanto o amor deles por mim. Talvez na minha ilusão juvenil eu tenha imaginado que aquele amor seria capaz de mudar qualquer coisa, até caráter ou personalidade, hoje eu sei que nem o maior amor do mundo é capaz destas coisas.
Meu pai me ensinou a ser amada com qualidade, com bem estar, me ensinou tão bem, que mesmo amando e sendo amada, sou capaz de ir embora se não sinto o bem estar na relação.
Meu pai me ensinou a ser segura de mim mesma, do meu sentimento, me ensinou a amar com qualidade, e por este critério eu posso errar de pessoa, mas jamais por amar ou ser amada de menos.
Ser pai de menina é isso, elevar o critério de escolha, contribuir com a qualidade da seleção natural.
Valeu pai! Te amo!


O meu, o seu, o nosso

Cada um nós somos um universo inteiro.
Não julgue, tente aceitar, entender nem sempre é possível, as vezes melhor é nem tentar.
Todos nós temos o nosso próprio deserto para atravessar, o nosso próprio inferno para conhecer e os nossos (todos) fantasmas para aprender a conviver enquanto não encontramos o exorcismo que funcione.
Conversando com uma cubana, me lembrei que uma vez ouvi de uma mulher aflita, "quando a porta do quarto se fechou e estávamos na cama aos beijos e carinhos, um a um me apareceram todos os fantasmas, minha terapeuta, por sorte, também apareceu e me mandou ir ao banheiro e me concentrar para que eles se fossem".
Julgamos que sabemos muito sobre o outro, o suficiente para prever seus pensamentos, adivinhar suas razões, quando na verdade somos todos um mistério uns para os outros.
É imensurável a distância entre duas pessoas e suas razões, suas motivações, seus desejos conscientes, sem contar seu inconsciente, que muitas vezes, governa tudo silenciosamente, manipulando vidas sem qualquer escrúpulo.
Somos mutantes, indeterminados, impermanentes. Somos como a lua e suas fases, cada qual com sua beleza e sombras. 
Somos como o tempo, amanhecemos ensolarado e chovemos ao entardecer.
Ainda bem que o sol nasce e outro dia vem e vai;
Somos como o tempo passando impunemente;
E as vezes nem sequer nos damos conta do que ficou no dia anterior.

Não há amor que resista a tanto perdão

Não estava caminhando, apesar de andar, sentia como se flutuasse, livre.
A sensação de liberdade é assim quando se revela, assemelha-se a um início de voo, primeiro flutua-se depois impulsiona-se e por fim voa.
Estava triste com a constatação, mas libertava-se da prisão que sua paixão a impunha. 
Por dois anos perseguia o desejo de ser única, sofrendo a cada descoberta que o dividia com a "novidade" do momento. A cada nova professora, a cada nova aluna, a cada nova vizinha, a qualquer mulher bonita que passasse, o temor pelos olhares interessados a entorpecia. 
Somente uma mulher que já fora traída e perdoara é quem a poderia compreender a insegurança, a desconfiança, o medo, a sensação de ameaça se aproximando.
Assim era sua vida a dois, seu marido seria perfeito se não fosse pela sua voracidade pelas mulheres. Todos os dias a despertava com beijos e carinhos, sem se importar com o desfecho da noite anterior, a cada dia um novo dia, ele dizia, e assim o fazia.
Eram parceiros nas afinidades, eram amigos que compartilhavam a vida e amantes perfeitos na cama, enfim um casal como poucos se viam.
Ele é professor de música na universidade, sua paixão pela música acabava por seduzir a todos e mais ainda as garotas.
A primeira vez que foi descoberto foi pelas artimanhas de uma aluna apaixonada, que pensou em destruir-lhe o casamento para ficarem juntos. O que a pobre não imaginou é que seu professor não tinha qualquer plano em divorciar-se, amava sua esposa, não imagina a vida sem ela, era para ele, como a música, essencial.
A esposa, ao deparar-se com aquela ninfeta na porta de sua casa dizendo o quanto amava seu marido e queriam estar juntos como marido e mulher, respirou fundo e sorrindo disse-lhe que era a terceira a bater em sua porta com a mesma história, então que fosse embora logo para desfrutar o que restara daquela diversão de seu marido porque não costumava durar mais do que uma semana.
Fechou a porta e chorou o fim de suas dúvidas e começo de uma nova vida, já não ignorava mais as aventuras do seu marido.
Ele lhe contou tudo, mas garantiu que não passavam de aventuras sem importância, não passavam de três encontros, nunca ficava com nenhuma mulher mais do que três vezes, pois não queria envolvimento com nenhuma outra mulher além dela.
Desde então sua vida se dividia entre o céu de uma vida a dois perfeita (quando ele estava com ela) e o inferno de saber que ele estava com outras quando não estava com ela. 
Ela desenvolveu mil e uma maneiras de saber quem era "a da vez" e isso a sangrava a cada descoberta. Sangrou tanto que morreu, seu amor foi morrendo pouco a pouco, lentamente dolorido, disfarçado, silencioso. Pouco a pouco perdeu a curiosidade em saber se ele estava dando aula ou passando seu tempo com a "novidade da semana". Pouco a pouco deixou de revistar sua roupa, sua carteira, seu celular, pouco a pouco não se interessava pelas afinidades dos dois, pouco a pouco buscou outros interesses individuais, pouco a pouco mudou de guarda roupa, pouco a pouco mudou de ambientes, pouco a pouco refez sua vida individualmente e pouco a pouco deixou de amá-lo e passou a amar-se.
Foi caminhando ao vento que sentiu sua liberdade apropriada, refeita, sólida.
Não há honestidade em uma relação onde somente um é feliz.
Não há amor que resista a tanto perdão.
Ninguém passa imune por tamanha indulgência.